Antes da viagem ... conversamos e fizemos várias reflexões sobre o modo de vida dos índios e o que esperávamos encontrar na Reserva Indígena Guarani de Bertioga
Lugar
Imaginamos um lugar grande, chão de terra, muita vegetação. Achamos que é um lugar pouco urbano, com animais – aranhas, cobras, onças - e rios. Achamos que tem muitos insetos. Que é difícil de chegar e que chegaremos a pé, percorrendo uma trilha.
Moradias
Imaginamos encontrar diferentes tipos de moradias. Algumas de barro e palha e outras de tijolos. A maioria das casas é feitas de tijolos. Achamos que os índios importantes moram nas casas de tijolos e os outros na de barro.
Alguns alunos acham que os índios têm móveis em suas casas como sofás, camas, mesas e cadeiras e comem com talheres. Outros alunos acham que não, que eles dormem em redes e comem com as mãos.
Vestimentas
Achamos que usam roupas como as nossas e somente em festejos e rituais é que usam as roupas típicas – saias, cocares e enfeites na cabeça que eles fizeram ou de seus ancestrais - e pinturas corporais. Alguns acham que as crianças pequenas devem andar sem roupas no dia-a-dia, outros que andam também com roupas como as nossas.
Alimentação
Devem usar os temperos que eles mesmos plantam. Podem pescar e caçar todos os dias ou somente em ocasiões especiais – temos esta dúvida - ou compram comida no supermercado.
Achamos que as mulheres cozinham e os homens compram comida na cidade. Alguns pensam que homens e mulheres cozinham, depende de quem estiver com fome.
Comem: peixes, batatas, frutas, carnes, arroz, feijão, vegetais.
Depende da comida ou da situação, comem com talheres ou com as mãos - nos rituais.
Tecnologia
Achamos que eles já usam geladeira, fogão, micro-ondas, TV, telefone, celular e computador e até videogame, mas que não são objetos tão atuais – de última geração – quanto os nossos.
Achamos que tem água encanada e sistema de esgoto.
Porém, nem todos os índios têm tudo isso. Apenas o cacique e sua família e eles emprestam para quem precisa. As tecnologias básicas – fogão, geladeira, etc... todos têm.
Festejos, costumes e rituais
As crianças têm o costume de brincar de pular corda, correr, amarelinha, “futebol de índio”, peteca, bolinha de gude, fabricam bolinhas com o líquido da árvore – látex.
Devem comemorar rituais tradicionais como: homenagem aos mortos, casamentos, nascimentos e rituais de passagem: de criança para adolescente, de adolescente para adulto e assim por diante. Devem ter comemorações especiais, que fazem parte só da cultura deles, mas não sabemos quais são.
Páscoa, Natal e aniversários temos dúvidas. Uns acham que comemoram, outros acham que não. Teremos que perguntar.
Trabalho e Renda
Têm diferentes fontes de renda:
- Vendem palmito na estrada;
- Vendem artesanato para os turistas;
- Vendem cana;
- Vendem comidas típicas: mandioca, peixes que pescam;
Alguns trabalham dando aulas.
Achamos que nem todas as crianças vão para a escola. Que elas estudam em casa. Se o pai morre, o filho mais velho deve ser o “homem da casa” e não pode ir pra escola, para cuidar da família (tornando-se “pai” de seus irmãos).
Transporte
Andam de bicicleta ou a pé. Não devem ter carro, nem moto. Usam este transporte para ir aos pontos onde vendem seus produtos. Podem pegar ônibus ou caronas.
Se vão levar o filho a algum lugar, usam banquinhos na bicicleta ou vão andando.
Podem também usar skate como transporte, que eles mesmos fabricam com madeira. Só se for no asfalto (precisamos perguntar.).
Escola
Pesquisamos que existe uma escola dentro da própria reserva e que ela é bilíngue: ensina português e guarani. A escola é aberta e as salas de aula são chalés. As crianças começam a frequentar a escola com 4, 5 ou 6 anos.
Quem dá aula na escola devem ser professores indígenas ou o pajé.
Eles aprendem outras coisas, como a própria cultura e a tecnologia não é tão avançada como nas escolas de São Paulo. Deve ter lousa.
Depois da viagem ...
Índios Guarani: modos de ver e viver nos dias atuais
Por alunos do 5º C
Estivemos na aldeia indígena Guarani, chamada Reserva Rio Silveira, em Bertioga, e fomos recebidos pelo Cacique Adolfo, seu nome em português. Ele nos recebeu na entrada da escola e nos levou por uma trilha de terra. Paramos em frente a uma estufa onde eles plantam palmito, pau Brasil e outras plantas. Depois disso, continuamos a caminhada até a casa de reza, onde ele respondeu nossas perguntas e nos contou um pouco de seus costumes. Ao final, tivemos a honra de assistir a apresentação das crianças e jovens da Aldeia.
No começo o clima estava tenso, pois o Cacique estava indignado com a disputa de terras entre indígenas e fazendeiros no Mato Grosso. Em Brasília, o parecer havia sido favorável aos fazendeiros, mesmo a terra sendo dos índios, segundo nos disse o Cacique.
Uma das questões que o Cacique contou é que os não índios tratam os grupos indígenas como se fossem inferiores, ou menos capazes de participar desta discussão.
Escola – entre a cultura branca e indígena
A escola não tem muros nem grades e as salas de aula são redondas. Todas as crianças da aldeia vão à escola e estudam lá até o 5º ano. Depois vão para a escola Estadual, junto com toda a população, inclusive com crianças não índias.
Sua opinião em relação à escola indígena é ambígua. Por um lado a escola é boa porque ensina português e guarani, dá acesso as diferentes tecnologias como internet e informática. Por outro lado, no entanto, é na escola que as crianças aprendem a comer comidas não saudáveis como macarrão, arroz e feijão, coca-cola e açúcar. Para o Cacique estas comidas não são consideradas saudáveis, pois eles comem alimentos vindos da terra como: mandioca, frutas, palmito, mel e, às vezes, quando caçam ou compram no supermercado – o que é raro, pois nem sempre têm dinheiro – comem carne ou peixe.
Outra crítica do Cacique em relação à escola, é que é lá que as crianças guarani aprendem a comemorar as datas cristãs como: natal, páscoa, dia das crianças e aniversário. A cultura Guarani não comemora essas datas e o Cacique acha que essas comemorações são somente para que os não índios vendam seus produtos. As crianças pedem presentes para seus pais e o Cacique é contra tudo isso.
Rituais
Essa aldeia comemora dois rituais. Em janeiro é o do batismo, em que as crianças recebem seus nomes guarani. Em setembro é o ritual da renovação dos espíritos ou o ano-novo. Nesses rituais eles ficam fechados e cantam a noite inteira.
Segundo o Cacique, o Pajé participa das comemorações e é uma figura muito importante para o grupo indígena. Ele cura doenças corporais e espirituais e tem o poder de tirar mau olhado e inveja. Cada pessoa tem seu lado bom e mau. Quando morre, a parte boa vai para Ianderutupã – o Deus deles – e a parte má fica na terra atormentando os vivos e dando mau olhado. Esses espíritos maus é que fazem as pessoas terem depressão e se suicidarem, na visão do Cacique. O pajé tem o poder de curar tudo isso.
Para ser Pajé é preciso ter um dom. Não é algo que passe de geração em geração. Já para ser Cacique, atualmente, depende de uma eleição. É uma função política e quem quiser ser Cacique tem que ser responsável e saber administrar a aldeia e tem que estar disponível para resolver todos os problemas acordando no meio da noite, se for preciso. Além disso, o Cacique deve viajar para Brasília ou para onde houver conflitos envolvendo grupos indígenas.
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Apresentação dos meninos indígenas para os alunos da Escola Viva |
Não se recebe dinheiro para ser Cacique e o Cacique Adolfo está no comando há 18 anos, pois até o momento não apareceu ninguém apto para assumir a liderança política da aldeia guarani. Para se candidatar ao cargo, precisa ter mais de 21 anos e pode ser mulher.
O Cacique tem a sua renda de outros trabalhos. Nesta aldeia, a renda das famílias vem de plantações próprias de frutas, palmito, mandioca, milho, pau Brasil, flores ornamentais e do artesanato. As famílias plantam o que conseguem e trocam entre si, pois dentro da Aldeia não circula dinheiro, tudo é trocado.
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Cacique Adolfo: há 18 anos
na função |
Quando têm uma boa renda dessas vendas, eles compram carne no supermercado. Eles só caçam quando falta dinheiro, pois querem preservar a vida dos animais e querem que as novas gerações os conheçam. Quando precisam, caçam pacas, cotias, porcos do mato e tatus. O mais comum é usarem armadilhas, mas usam arco e flecha e sarabatana para caçar animais maiores. Uma técnica utilizada é colocar na ponta da flecha um pouco de veneno de sapo e então atirar nos animais.
Uma gota do veneno deste sapo pode até matar 20 homens, segundo disse o monitor que nos acompanhou neste estudo.
O índio e a saúde
Atualmente, além das ervas de cura dadas pelo Pajé, os índios também tomam vacinas e se consultam em postos de saúde. Lá recebem cuidados médicos e odontológicos e aprendem a escovar os dentes.
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Detalhe dos materiais usados na construção |
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Moradia indígena |
Embora algumas casas sejam construídas com barro, madeira e palha, os agentes de saúde aconselham que os índios construam casas com tijolos, pois as de barro ficam úmidas quando chove e a umidade traz doenças e problemas de higiene entre as crianças. Algumas casas já são feitas de tijolos.
Costumes e tradições
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Alguns padrões de pintura corporal |
Em dias muito frios e chuvosos, todos se reúnem na casa de reza e fazem uma fogueira para espantar o frio e cozinhar alimentos típicos. Eles também usam fogões a gás, mas não perderam a tradição de assar seus alimentos em fogueiras.
Este grupo tem acesso a maioria das tecnologias que nós temos como celulares, internet, fogão a gás, geladeira e televisão. Há apenas uma televisão na aldeia, usada em ocasiões especiais.
O cacique criticou a existência do dia do índio. Disse que essa data existe apenas para justificar a matança dos grupos indígenas feita pelos brancos e que dia do índio é todos os dias.
O Cacique se ressente do fato de que alguns brancos contam histórias em que índios comem crianças, mas isto não é verdade. Os índios não são violentos, eles são guerreiros que atacam quando são atacados ou quando tem suas terras invadidas.
Por fim, foi interessante perceber nesta visita que a terra tem uma grande importância para os grupos indígenas e que eles não pensam em utilizá-la com a lógica do branco.
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Nossa despedida da Reserva Rio Silveira: mostrando que o encontro do índio com o branco pode ser pacífico e enriquecedor para a cultura de ambos |